quarta-feira, 2 de maio de 2012

A visão de Calligaris....



O psicanalista Contardo Calligaris, autor de 11 livros, sendo os dois últimos romances. Entrou para o gênero ficção: “Uma ficção se constrói a partir de pequenos elementos da sua vida, sobretudo aqueles que você não conseguiu costurar direito. Você costura as coisas, de uma maneira ou outra, dá um destino”, resume Caligaris. 
O italiano, repensa o uso de medicamentos como “antídoto para o mal-estar no mundo contemporâneo”, a obsessão em se evitar a morte – uma idéia higienista que mostra como “a medicina se tornou a disciplina que nos diz como viver muito mais que a religião” - e as mudanças de valores propagadas nos últimos séculos: “qualquer homem do século 18 pensa que os valores são aquelas coisas pelas quais vale a pena morrer. Então, tem uma mudança: de repente qualquer coisa vale a pena com a condição que nos permita sobreviver”...
“Viagem ao Brasil”, é oferecida como “um escrito de amor” ao País que escolheu como lar em 1989: “Que a paixão por esta terra se confundisse com a paixão por uma mulher é algo que não me parece comprometer nenhum dos dois amores. Pelo que vou entendendo da minha paixão brasileira, aliás, esta terra, mais do que qualquer outra, talvez seja destinada a ser amada como um corpo feminino”...
A cada capítulo, Calligaris apresenta suas cogitações sobre a criação do brasileiro e suas diferenças ante a educação e o pensamento europeus. A leitura exige concentração e um desenvolvimento conjunto do raciocínio para que os inúmeros “significantes” teóricos citados ganhem sentido prático. 



O capítulo “Crianças”, mostra que, no início da década de 90, o escritor já se assustava com a falta de limites impostos pelos pais. “O Brasil me aparece como o paraíso das crianças. Estranha-me o sorriso do garçom de um restaurante luxuoso tragicamente atrapalhado no serviço por uma turma de meninos correndo entre as mesas. E também que nenhum cliente pareça se incomodar com o barulho do qual não dava para suspeitar que estivesse incluído no preço. Brevemente: a criança é rei. Curioso, tanto mais num país cuja reputação no estrangeiro está comprometida com legiões de crianças abandonadas na rua”. 
Calligaris apresenta sua tese do “gozo sem limites” e a “impossibilidade (do brasileiro) de levar a sério as instâncias simbólicas”, com episódios que vão desde a nossa carteira de trabalho até a fachada dos motéis. 
“O Conto do Amor”, lançado em 2008 pela Companhia das Letras, é bom. O personagem central é Carlo Antonini, psicanalista narrador, às voltas com casamentos fracassados e de personalidade “barroca”. A trama se desenrola após uma conversa com seu pai, figura reservada e carente de sentido. A resposta, que o protagonista resolve encarar só doze anos após a morte do pai, demanda uma série de visitas a mosteiros, ruínas e hotéis da Itália pós-guerra.
Surge Nicoletta, personagem cúmplice, historiadora, amante e sobrinha, cujo passado ela mesma desconhece. Do livro: “Porque você é a única mulher para quem contei, e a única para quem contarei, que meu pai era a reencarnação de um pintor do século dezesseis, e ainda por cima menor”.
“A Mulher de Vermelho e Branco”, também da Cia. das Letras (2011, R$ 39) o personagem central é o mesmo, mas o relato baseia-se em indiscretas fofocas sobre pacientes caricaturados.... afinal, ele é um Psicanalista.....

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