A aldeia Yawalapiti, no Parque
Indígena do Xingu (MT), no domingo, dia 19, homenageou o espírito de Darcy
Ribeiro.
Depois de encarnar num tronco de árvore para se despedir e ser chorado
pela família e amigos, ele subiu aos céus. Foi com o ritual do Quarup, que os
yawalapitis, índios do Alto Xingu, homenagearam no fim de semana, um dos
maiores defensores dos povos indígenas brasileiros. Darcy partirá da Terra,
como fazem os mortos nas noites de eclipse, para roubar penas dos pássaros e
adornar seus enfeites. Eu tive a chance de estar com ele há muitos anos e
participar da cerimônia de despedidas dos seus mortos. Incrível.
Os índios recorreram à
memória de Darcy Ribeiro, morto em 1997, para alertar os brancos dos perigos
que rondam o Parque Indígena do Xingu e ameaçam suas civilizações milenares: “Homenageamos
um grande homem branco, mas queremos que os brancos olhem para os índios, que
respeitem nossos direitos e nossa terra, que é de onde vêm nossa comida e nossa
cultura”, disse o cacique Aritana.....
Os yawalapitis, uma das 16
etnias do Xingu, são um povo saudável, que renasceu com a criação do parque. Eram apenas 19 índios quando
foram reagrupados pelos irmãos Villas Boas, em 1961. Hoje, são quase trezentos,
um terço crianças. O ciclo dos últimos 51 anos, da sinais de inversão na celebração. Não foi tarefa fácil pegar peixe
suficiente para alimentar os convidados das aldeias vizinhas, muitos dos quais
também já não puderam usar os rios para chegar ao local da festa: “Antes, a
gente só usava os rios para andar entre as aldeias do parque. Agora, tivemos
que abrir uma estrada porque tem lugares em que o barco não passa mais. O
peixe, que é a base da nossa alimentação, também já não é tão farto. Muitos
canais de ligação dos rios com as lagoas, onde eles se criam, ficaram
completamente secos. Isso não acontecia até poucos anos atrás, mesmo no período
sem chuva” conta Watatakalu, do Conselho de Mulheres yawalapitis e uma
das articuladoras da manifestação durante o Quarup.
As limitações experimentadas pelos povos do Xingu refletem as pressões que se
intensificaram na área em torno do parque.
As
fronteiras secas, mostram o
desmatamento para o plantio de soja e a mata densa da área protegida. Nos
limites dos rios, há pontos em que a margem oposta
ao parque foi desmatada até a praia.
A balsa de ferro, que até 2005 navegava por todo
o parque durante o ano inteiro, está parada já há dois meses na margem do
Tuatuari, rio que banha a Aldeia Yawalapiti, e só deve ganhar a água novamente
em janeiro, no auge das chuvas.... "Essa balsa navegava
pesada, levava até combustível para os aviões da FAB. Desde a construção de uma
PCH (hidrelétrica de pequeno porte) lá na cabeceira, há três anos, ela passa a
maior parte do tempo parada aí", afirma Pirakumã.
Mostra do que está por vir
com o grande golpe nos direitos indígenas, maquinado em Brasília: a Proposta de Emenda Constitucional 215, que dá ao
Congresso a competência exclusiva para estabelecer os limites das áreas
indígenas e decretar a criação de novas áreas; a portaria 303 da Advocacia
Geral da União (AGU), que exclui os povos indígenas das consultas sobre a
realização de empreendimentos de interesse público em suas áreas; e as mudanças
no Código Florestal, que flexibilizam as áreas de proteção permanente (APPs) e
deixam vulneráveis os rios.
"A gente não pode nem
pensar o que vai acontecer se essas coisas forem adiante. Quem diz que não vai
acontecer nada é porque não conhece ou não quer ver", lamenta Pirakumã.
O horror que
paira sobre os indígenas que foi capaz de unir as 16 etnias do Xingu.
Todos os líderes do parque assinaram manifesto
endereçado à presidente Dilma Rousseff, que foi lido na
abertura do cerimonial do Quarup e deveria ter sido entregue à ministra da
Cultura, Ana de Hollanda. Para não receber a carta, a ministra se escondeu em
uma oca e, no dia seguinte, justificou-se dizendo que o documento tratava de
temas alheios à sua área, a da cultura. Watatakalu discorda e é didática com a
ministra: "A nossa cultura, a nossa
tradição, a nossa vida é a nossa terra. Sem nossa terra e sem nossos rios não
vai existir nada do que ela está vendo aqui, não vai existir cultura nem vai
existir índio."....
A carta, marcada com o
urucum da pintura ritual, foi recebida pelo senador Rodrigo Rollemberg
(PSB-DF), que leu o documento no plenário do Senado e disse que vai entregá-lo
à presidente Dilma......
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