Ana Botafogo tem no rosto,
as marcas do tempo, mas quando surge de mangas bufantes e laçarote sobre a
trança como a Tatiana de Onegin, em cartaz no Municipal do Rio, o que vemos é
uma adolescente do interior da Rússia do século 19, romântica e cândida. Ao som
de Tchaikovski, se transforma numa mulher madura e ferida pelo desamor. O balé
é o último do repertório clássico com a sua participação. Aos 55 anos não
declarados, 36 como profissional dos palcos, ela está a um passo da
aposentadoria do teatro, do qual é funcionária desde 1981 e um símbolo maior.
A
partir de agora, irá dançar coreografias criadas especialmente para ela, de
menor duração. Ou dirigir montagens: "Não vou pendurar as sapatilhas. Posso até
fazer um ‘pas-de-deuxzinho’ de vez em quando. Só não quero mais ser escrava da
profissão. Considero Onegin a minha despedida do Municipal. Sou uma máquina que
já foi muito usada. O desgaste nesse balé é o mesmo de uma menina de 20 anos,
só que num corpo muito mais cansado. Melhor parar por aqui do que continuar e
daqui a pouco apontarem: ‘Coitada, parece um saco de batata, devia ter se
aposentado!’”
”Ela pode fazer o que
quiser no Teatro Municipal”, diz a diretora, Carla Camurati. “Sua relação
conosco é tão estreita e especial que sobram possibilidades para se explorar.”
Depois do “violento” Onegin
- em que Tatiana
é jogada no chão, puxada, faz sequências de altíssimo grau de dificuldade -,
virão passos menos desgastantes. “Mas não pensem que vai ser balé alternativo.
Não vou dançar descalça.” Tem apresentações marcadas até o fim do ano pelo
Brasil, alguns solos, criações de coreógrafos contemporâneos com as quais já
vinha excursionando e palestras.
Ana Botafogo, no fundo,
teme sentir saudades da rotina do Municipal.
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